domingo, 5 de junho de 2011

A FLOR E O EXEMPLO

 Na aridez das glebas agrestes floresce a sinuosa flor, paramentada com requinte pela mãe natureza que, embora seja pobre naquele ermo, dá para a filha o que pode de si mesmo.

A flor, não tendo como explorar o caule seco e quebradiço amparador de suas raízes retorcidas e esquálidas sedenta de líquidos, ameniza suas formas, como a pedir clemência ao meio circunvizinho e ao "astro-rei", este último, orgulhoso e indiferente pela secura daquele deserto, assim tornado pela sua passagem diária
Mesmo sem ser atendida, a flor continua seu círculo de vida embelezando como pode a áspera vizinhança, satisfazendo-se com as migalhas de orvalho e as inconstantes e cada vez mais esporádicas chuvas.
Sua paupérrima existência ensinou-lhe como sobreviver com o mínimo necessário e, em razão disso, ela nada desperdiça, desde o adubo das raízes e folhas mortas e secas até as acumuladas e fofas fezes de insetos que peregrinam à sua volta.
A cada amanhecer, a flor prepara-se para a próxima canícula fechando o que pode de suas pétalas, e ativando a sudação para diminuir a secura dos raios solares, pacientemente, apronta-se para enfrentar os dissabores do radiante dia, não reclama não se afasta não se entrega!
Com a proximidade da tarde, ela está quase desfalecendo, sua sudação é pastosa e ressequida desenhando arabescos nas folhas de pontas e pecíolos quebradiços, mas... Está feliz! Foi mais um dia vitorioso e um embate firme, desafiante em sua humildade, esbelta e mais bela, além disso, vencera o sol, ele?...Desaparecera no ocaso passando por ela devassador e sugador, mas, apenas passou não a venceu!
Sabe que teve um átimo de ajuda para aquele combate, fornecido pela brisa filtrada dos vapores quentes, pelas ocasionais sombras dos alcantis e pelas raras nuvens passageiras e, com isso, ficou... Agradecida! Tem conhecimento de que o sol fora embora despeitado por não vencê-la tão frágil e mimosa, tão desprotegida em relação as pedreiras e areais domados e sugados por Ele, no entretanto, mesmo assim, fora a vencedora!
Agora... A noite aproxima-se célere e aconchegante, é momento de reabilitar-se em suas reservas de forças para a próxima luta, contudo, também, é hora de meditar...
Na calada da noite e no amainar dos vapores caloríficos, fica "matutando" a razão de sua vida ainda em flor...vida ?, Sim... É isto!
Enquanto se apega a vida Ela, dificilmente, sai do corpo (qualquer corpo) mesmo o de uma simples flor do deserto agreste e desaguado:
Vida é viver e não apenas passagem! É passaporte ao Jardineiro dos Tempos, viajor que conduz quando quer fazer metamorfose, mudas, enxertos ou, simplesmente... Ceifar! Não importando as intempéries, os agentes, locais... Nada importa! Só a vontade do Arquiteto e Criador, se Ele quiser, coloca a flor no infinito junto aos astros e, o sol, naqueles centímetros quadrados da planta em referência.
A cada ser animal ou vegetal fora dada uma vida, existência essa nas condições do presente doado e, ao recebedor, só caberá viver! Seja em que condição for, mas, viver para dar valor a vida até o dia da ceifa, mudança ou outra forma a critério do Jardineiro Celeste.
A flor do campo e do agreste é, em sua origem, a mesma do palácio e vitrines que, por sua vez, é a mesma dos páramos, pântanos e esgotos, não importando a reação que causem aos demais, mesmo que esta reação passe do embevecimento ao asco, da admiração ao desprezo, o que importa é a existência da vida que cada uma tenha para viver e não as emanações e motivações que possam desprender!
A flor citadina sofre o mesmo que a flor paupérrima e não mimada dos desertos e locais agrestes, só que, os impulsos negativos e as ações dirigidas a Elas, são diferentes em extensão e qualidade, todavia, a sobrevivência é a mesma desde que o caminho seja para... Viver!
Quando se tem tudo não se dá valor a nada!
Quando não temos nada, damos valor a tudo e aproveitamos o que podemos na ocasião carente!
A flor da árida, pedrejante e areenta gleba, aproveita o que pode apenas para viver!
Como seria feliz o homem se, ao invés, de procurar as estrelas para conquistá-las andasse à procura das plantas para observá-las e imitá-las! Procurando lutar pela vida e não pela vida fácil, fazendo com que, a cada dia passado, ficasse acrescido de valores e se preparando para o dia seguinte com humildade, tais e qual, a flor do campo, apenas juntando o necessário para o combate seguinte, sempre à espera do Jardineiro e das mudanças que Ele achasse de bom alvitre, isto sem nunca espezinhar o vizinho ou tomar-lhe o lugar e os bens, exemplo esse que, nunca, receberia da recatada flor.


Sebastião Antônio Baracho



























Nenhum comentário:

Postar um comentário